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'A Longa Marcha': ninguém pode passar duas vezes pelo mesmo caminho

  • Foto do escritor: Samantha Oliveira
    Samantha Oliveira
  • 19 de set.
  • 3 min de leitura
'A Longa Marcha' traz reflexões sobre poder, honra, dinheiro e religião em meio a cenário distópico
'A Longa Marcha' traz reflexões sobre poder, honra, dinheiro e religião em meio a cenário distópico

O quanto somos afetados pelo caminho que percorremos para conquistar o que tanto desejamos? E o quanto o capitalismo nos afeta, durante todo esse processo? Chegando aos cinemas atraindo olhares curiosos sobre a sua premissa pouco comum, 'A Longa Marcha' é o novo filme baseado em um livro homônimo de Stephen King.


A proposta, por si só, desperta a curiosidade do público: em um mundo distópico, 50 jovens se voluntariam para participar de uma competição onde devem caminhar por tempo indeterminado até que sobre apenas um deles. Quem desistir ou não conseguir caminhar mais, receberá o chamado "bilhete": um tiro fatal.


'A Longa Marcha' traz elementos comuns para uma distopia funcionar e ter aquele ar de "isso poderia tranquilamente acontecer aqui ou nos Estados Unidos": crise econômica, autoritarismo militar, uso da mídia como forma de reforçar esses sistemas, e direção de Francis Lawrence (que fez da saga 'Jogos Vorazes' uma obra-prima nesse segmento).


O longa não tem problema em repetir esses elementos comuns, assim como o grande futuro e riqueza prometidos ao tal único vencedor. O que o diferencia aqui, são os monólogos bem construídos e as reflexões apontadas ao longo dos quilômetros percorridos.


Marcha, soldado


Com uma boa exploração visual do cenário distópico, Lawrence consegue, mais uma vez, mostrar um pouco daquele mundo pouco conhecido pelo público, que sofre com a pobreza econômica, mas vibra a cada edição da caminhada sanguinária.


'A Longa Marcha' é baseado em livro de Stephen King
'A Longa Marcha' é baseado em livro de Stephen King

A tensão é o maior mérido de 'A Longa Marcha' que, por mais que apresente o destino óbvio de 49 personagens, consegue construir medo, expectativa e cenas desconfortáveis de assistir. A escolha de mostrar as mortes de forma explícita não é meramente para chocar ou agradar quem gosta do visal mais gore: está ali para causar o incômodo, o qual os sobreviventes também estão sentindo, um passo após o outro.


O mal estar é duradouro, e só consegue ser diluído pelas conversas - onde o espectador e o protagonista, Ray Garraty (Cooper Hoffman), encontram algum tipo de conforto. Nos diálogos, o espaço se abre para reflexões sobre dinheiro, honra, religião e críticas ao sistema.


Acho que já passei por essa rua


Ainda assim, 'A Longa Marcha' é um filme feito de homens para homens. A ausência feminina é um ponto que não dá para passar despercebido, já que a única presença relevante ao longo do filme é a da mãe de um dos protagonistas, aqui interpretada sensivelmente por Judy Greer. Chego a pensar que certas reflexões feitas pelo grupo de amigos ao longo da caminhada é apenas uma noite mais tranquila de uma festa do pijama de meninas aos 10 anos.


O roteiro também peca ao colocar o personagem Peter McVries (David Jonsson) em um local já conhecido a figuras negras no cinema: o negro melhor amigo, o negro otimista, o negro forte, e por aí vai. Este, sendo o mais carismático dos competidores e não apresentando um caráter questionável, parece ter sido pensado e feito como mais uma engrenagem da trama - a famosa 'muleta' do protagonista (aqui, às vezes, em sentido literal).


Quem somos nós depois da caminhada?


Cooper Hoffman é um dos protagonistas de 'A Longa Marcha'
Cooper Hoffman é um dos protagonistas de 'A Longa Marcha'

Depois de tantas cenas de morte impactantes, o que sobra para finalizar 'A Longa Marcha'? Ao que se deram todos aqueles diálogos sobre poder, revolução, propósito e o que seguir depois da linha de chegada?


Indo de contra ao que já tinha feito o filme inteiro, a escolha da produção é a mais sensível, poética e triste possível. No fim, os que sobraram não são mais os mesmos que entraram no rio - seguindo a famosa filosofia de Heráclito. A luz no fim do caminho foi apagada, os passos são contados e, por mais que se saia dos trilhos (ou da estrada), o caminho já se tornou parte da gente e, a gente, o dele.


Veredicto: 3.9/5

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